Reconhecendo a necessidade de curar
Compartilho abaixo de um texto do livro de Peter A. Levine : O Despertar do Tigre – Summus Editorial.
As culturas que usam o ritual e xamãs para curar o trauma podem parecer primitivas e supersticiosas, mas têm uma grande vantagem – abordam diretamente o problema. Essas culturas reconhecem abertamente a necessidade de cura, quando alguém em sua comunidade foi sobrecarregado pela ameaça. A maioria das culturas, incluindo a nossa, sofre da opinião dominante que a força significa capacidade de aguentar; que é de algum modo heroico ser capaz de continuar em frente independentemente da severidade de nossos sintomas. A maioria de nós aceita sem questionamento esse costume social. Usando o poder do neocórtex, nossa habilidade de racionalizar, é impossível dar a impressão de que se atravessou um acontecimento bastante ameaçador, mesmo uma guerra, sem “nenhum arranhão”; e isso é o que muito de nós fazemos. Continuamos “cerrando os dentes” e conseguimos a admiração dos demais – heróis, como se nada tivesse acontecido conosco.
Esses costumes sociais cometem uma grande injustiça com o indivíduo e a sociedade, ao nos encorajar a sermos super-humanos. Se tentarmos seguir com a nossa vida, sem antes atender aos apelos urgentes que nos guiam de volta a essas experiências angustiantes, então a nossa exibição de força passa a ser mais nada do que a ilusão.
Enquanto isso, os efeitos traumáticos ficam cada vez mais graves, firmemente enraizados e crônicos. As respostas incompletas, que agora estão congeladas em nosso sistema nervoso, são como bombas-relógio indestrutíveis, programadas para explodir quando evocadas pela força.
Continuaremos a ter explosões inexplicadas até que os seres humanos possam encontrar as ferramentas apropriadas e o apoio necessário para desmobilizar essa força. O heroísmo real vem da coragem de reconhecer abertamente as próprias experiências, não suprimi-las nem negá-las.