EAC – Stanley Krippner
*Stanley Krippner* é um dos grandes pesquisadores mundiais sobre estados alterados de consciência. Ele deu uma entrevista em 1990, que quero compartilhar alguns trechos:
Fiz pesquisas no campo das curas entre povos nativos e indígenas e curas entre distintas culturas, quando escrevi um livro sobre estados Alterados de Consciência. essa obra contém um capítulo chamado : “Um chamado para curar”, que é o resultado de meus encontros com 40 curadores populares do Brasil, ligados ao candomblé, à umbanda, ao kardecismo e a várias outras tradições. Pude então identificar cinco meios diferentes pelos quais tais pessoas são motivadas a curar, e os que são mais frequentes.
As motivações mais comuns são os “Chamados” em sonhos e em Estados Alterados de Consciência. Defino xamãs como homens e mulheres que foram socialmente designados por uma tribo ou comunidade para praticar aconselhamento, curas, terapias e coisas assim. Essas pessoas alteram deliberadamente suas consciências para entrar no mundo espiritual, de onde trazem poder e informações para servir ao seu grupo.
Os EACs são indispensáveis para o xamanismo e podem surgir de várias maneiras, tais como por plantas de poder, pelo jejum, sonhos controlados, danças ritualísticas. Os xamãs que fazem uso de plantas de poder, ao meu ver, procuram fazê-lo de modo seguro, visando fins espirituais. Não tenho nenhuma objeção a isso.
Nas Américas, é, certamente, um meio frequente e bem eficiente para os xamãs, e tem propiciado a realização de belíssimos trabalhos artísticos e interessantes aprofundamentos filosóficos.
Toda a realidade é uma. Penso que os xamãs que usam plantas de poder para chegar em EAC, ou por qualquer outro meio, conseguem notar fenômenos que não perceberiam de outra maneira. É costumeiro verem cores e formas diferentes, aromas e odores diversos e sons distintos. Eles tem maneiras diferenciadas de sentir a natureza e de compreender as outras pessoas. Trata-se de uma expansão da percepção da realidade que está sempre ao nosso redor.
Considero o Dr. Albert Hoffman, o descobridor do LSD, um dos grandes sábios do mundo ocidental. Grande inteligência, é que é mais importante, de grande integridade. Não foi apenas o descobridor do LSD, mas colaborou em estudos históricos, sugerindo, por exemplo, que os rituais místicos da antiga Grécia eram dinamizados por um fungo alucinógeno que cresce no centeio. Seus escritos filosóficos acerca de suas experiências com o LSD são muito profundos e repletos de sabedoria. Pessoas como o Dr. Hoffman poderiam ensinar aos demais indivíduos o caminho apropriado de usar tais substâncias. Apesar de não ser um xamã, ele tem o que chamaria de “sensibilidade xamânica”, num grau inigualado por qualquer outra pessoa no Ocidente.
Ao ser questionado se já tinha experimentado alucinógenos, Krippner respondeu :
Experimentei todos! Nas poucas vezes que tomei tais substâncias felizmente me saí muito bem, com uma ampliada apreciação da natureza. Devo dizer que sempre fiz as experiências ao ar livre, após uma preparação e sob supervisão de pessoas experientes, capazes de nos guiar no caso de qualquer emergência.
Certamente, as experiências aumentaram a minha consciência social, tornando-me mais ativo na defesa do meio ambiente, das florestas tropicais e dos povos indígenas. Melhoraram a minha maneira de apreciar as artes e a música, uma vez que afetaram a minha sensibilidade estética.
Tive ainda muitas ideias criativas que pude empregar na vida cotidiana e senti que meu relacionamento com os amigos que me acompanharam na experiência tornou-se mais fluido.
Continuando a entrevista com Krippner, foi perguntado a ele, se existe alguma perspectiva de a humanidade aprender a usar corretamente substâncias psicoativas :
“Reparei o abuso dessas substâncias em quase todos os lugares pelos quais venho viajado, principalmente nos países chamados “civilizados” ou industrializados, e não vejo muita esperança (13 anos atrás) de que uma abordagem mais racional possa ser feita, até porque envolve questões políticas. Existem pouquíssimos lugares no mundo em que alucinógenos podem ser usados, por exemplo em psicoterapia. A Suíça é um deles, graças ao Dr. Hoffman.
Em países como os EUA, os alucinógenos tem sido igualados e confundidos com outras drogas, quase que ignorando as grandes diferenças entre as várias substâncias psicoativas. Lá, a reação das autoridades tem sido incorreta, a meu ver. Gasta-se muito dinheiro para perseguir fabricantes, traficantes e consumidores de drogas, bem como para destruir depósitos e plantações, mas pouco é destinado para a educação e tratamento dos drogados.
Muitos confundem drogas como a heroína e a cocaína com a substância advinda dos cogumelos sagrados, do cacto peiote e a ayahuasca, que são coisas bem distintas.
Não sou, obviamente simpatizante dos traficantes, mas não posso virar as costas para o fato de que, por exemplo, os EUA vendem muitos cigarros de tabaco para a Colômbia e matam mais colombianos com o tabaco do que estes matam americanos com cocaína.
Não sou defensor irrestrito da maconha, mas sou obrigado a encarar o fato de que é uma droga incomparavelmente menos prejudicial em sua capacidade de viciar e matar pessoas do que o cigarro.
Tomei ayahuasca e tive uma experiência muito agradável, num ambiente muito propício. Acho que os ayahuasqueiros do Amazonas estão usando a planta de uma forma muito séria e sábia, embasados numa longa tradição.
O movimento Santo Daime é muito interessante, apesar de não ser o autêntico ritual usado no Amazonas. Fico satisfeito em saber que os grupos de Daime não estão sendo perseguidos no Brasil.
Li todas as obras de Carlos Castañeda. Trata-se de uma literatura muito boa, mas não enquanto estudo antropológico. Há erros de cronologia e na descrição de costumes indígenas. Tenho dúvidas que tenha existido um Dom Juan, mas acho que os livros contém maravilhosos ensinamentos e podem ajudar as pessoas a encontrar seus caminhos neste mundo tão confuso e conturbado.