Recebendo as Bênçãos para a condução

 

DIÁRIO DE BORDO  21/08/98 – A Tenda-do-Suor e Cachimbo Sagrado – EUA

Fui com John na casa de Curtis e Cheryl. Ambos são water pools ( comandantes de sweat lodge ).

O caminho em si já fora uma jornada fascinante. A beleza natural do lugar, todo arborizado, com salgueiros, realmente um lugar de poder.
John comprou tabaco para oferecermos ao seu professor.

Quando chegamos, encontramos o filho de John, e ele foi logo dizendo, que falava um pouco o português, pois tinha uma namorada brasileira na Bahia.
Enfim encontramos, o Coiote-em Pé ( Standing Coyote ) Um xamãzão. Um homem muito forte, carismático, magnético. Cheryl, sua esposa, uma doçura, a condutora da sweat lodge feminina. A casa era um sonho, no meio de um bosque.

Começamos a conversa, e , antes de anoitecer, fomos ver a sweat lodge do casal. Ao caminharmos, encontramos uma casca quebrada de uma tartaruga, que devia ter sido atropelada por um dos carros. Nesse momento Cheryl, parou e ofereceu tabaco para o espírito da tartaruga.
Ao chegarmos, duas sweat lodges dakotas : A primeira Para Todas As Nações com a porta de entrada para o Leste, e a segunda com a porta de entrada para Oeste.

Na conversa, Coiote me dizia que a preparação de water pool, levava anos. Eu respondi dizendo que já havia feito a sweat há anos atrás, e várias vezes. Que eu me sentia capaz de conduzir, mas não queria fazê-lo, sem ter uma ligação espiritual com a tradição, e era para isso que eu tinha feito essa viagem. Disse-lhe que a única coisa que poderia pedir é que ele deveria decidir se confia ou não em mim, me sentindo, falando com seus espíritos.

Na nossa conversa eu senti que Coiote já havia percebido minha forte conexão espiritual com os nativos norte-americanos. Ele disse:

– Você está muito longe para ir e voltar para cá. No seu povo não existe ninguém que faça esse trabalho. Eu sei que as pessoas querem e precisam disso. Eu lhe passarei uma medicina que levariam anos para você aprender, mas o suficiente para que faça esse trabalho com seu povo.

Coiote sabia que eu dirijo trabalhos do Santo Daime, isso também ajudou muito. Voltando encontramos um veado, o que era um excelente, segundo ele mesmo, prenúncio.

Ele me orientou a construir a tenda com bambu ou árvores nativas. Construi-la com uma cruz no alto, para dar maior proteção.

O altar deve ser construído tendo um chifre de veado ( ou crânio ) para a Medicina do Leste. Falou também para eu por um cruzeiro e minha medicina pessoal. Embaixo, sal para segurar o negativo e um copo de água.

Disse-me que a quantidade de pedras virá com as visões e que devo sempre estar atento na intenção e sentir o que chega em minha mente/coração. Coiote e eu conversamos muito. Sempre acompanhados da presença adorável de sua esposa e John.

Eu entendí que todo esse ritual, era para me avaliar.

Coiote leva a vida de forma muito natural e espiritual. Ele e sua família andam no Caminho Sagrado. Antes de jantar rezamos uma prece lakota, num circulo em volta a mesa, de mãos dadas. Após o jantar, o filho mais velho de Coiote dava um verdadeiro show no violão, tocando músicas do oeste.

Eu dei um livro O Voo da Águia para eles e comecei a mostrar e a traduzir algumas passagens. Nesse momento senti que tocava forte o coração deles. O momento mais interessante foi quando mostrei o meu hino Novo Horizonte ao Coiote, pois ele conseguiu traduzir e pediu-me para ler e confirmar. Decidi, nesse momento, pegar o violão emprestado e cantei o hino. Marquei mais um gol ! Ficaram encantados!

Após a farta sobremesa, já senti que nos conquistamos mutuamente, e fui aprendendo muito com os dois. Fizemos a cerimonia do Cachimbo Sagrado (Chanumpa). Linda e forte.

Coiote pediu minhas bênçãos para o Universo. Seu filho teve a impressionante visão do quarto místico (onde medito), descrevendo-o com detalhes. Viu também uma Águia voando por sobre as águas e ficou emocionado, com lágrimas nos olhos.

John orou por sua família e me agradeceu por estar nesse momento, fazendo parte de sua família espiritual. Por vários momentos, eles diziam “wasthe”, que significa muito bom, de acordo.

A partir daí, de momento a momento, fui recebendo presentes :

1-   Um envelope contendo sementes de tabaco tradicional, com mais de 500 anos, encontrado em um túmulo nativo , para eu plantar.

2-   Sweat Grass

3-   Folhas da árvore do Sundance

4-   Uma benção do cachimbo, o que me torna um pipe carrier, portador de cachimbo.

É uma cerimônia, onde recebi a pedra da Montanha Negra, local ancestral dos lakotas, para colocar no meu cachimbo, numa pequena bolsa e deixá-lo junto.

Coiote disse-me, que desta forma, o cachimbo não sentirá saudades do lugar de onde ele veio. Era atado a uma fita vermelha.
Ao me passar a pedra, eu só deveria apanha-la, quando sentisse o pulsar de meu coração na mão esquerda, e disse-me que quando eu estiver fumando, deveria sentir o mesmo, pelo menos uma vez.

Deu-me a pedra numa bolsa de couro, contendo o tabaco da consagração, que deverei fazê-lo sozinho no meu retorno ao Brasil. Não deverei fumar outro até fazer isso.

5 – Uma pena de falcão, do peito, para utilizar no cachimbo e ser retirado ao final da cerimônia.

6-   Uma fita contendo as canções de poder para serem utilizadas na sweat lodge e na pipe cerimony.

7-   Um boné da tribo da reserva Lakota de Rosebud, com o símbolo da Roda Medicinal, que é dado aos novos guerreiros.

John dizia que eu sou um homem de sorte, pois, o que me foi passado, levaram anos para ser passado para ele.
Coiote não permitiu que eu usasse o seu nome, a não ser o espiritual. E também não permitiu fazer fotos.

O clima de carinho e amor foi contagiante, parecia que o meu coração iria sair pela boca. Pediu para eu não cobrar o trabalho (tenda do suor) e para que as pessoas não ficassem nuas na tenda, pois poderia roubar poder.

Pediu para que os espíritos me protegessem no caminho, e que eu pedisse permissão aos espíritos brasileiros para que eu tivesse uma conexão espiritual com ele. E, que eu lhe escrevesse uma carta, e manter conexão espiritual com ele, pois passo a integrar a sua família espiritual, e assim garanto a segurança espiritual.

Mais uma parte da missão cumprida. Tenho a autorização que vim buscar formalmente e cerimonialmente para o cachimbo e a sweat lodge lakota.

Três dias após : RECEBÍ UM RECADO DE COIOTE-EM-PÉ, ATRAVÉS DE JOHN :

Ele disse que recebeu uma mensagem dos espíritos. Para que eu tivesse muita calma e tranquilidade com as pessoas que forem fazer a sweat lodge. Disse que alguns new ages não respeitam as tradições, e, que eu não deveria ficar com raiva na sweat lodge. Com muita calma, explicar a pessoa, se ela não entender, deixar.

De resto, renovou a confiança na seriedade do meu trabalho, e do que estarei realizando, pedindo que eu tivesse humildade.

 

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