Xamanismo e as Religiões
Foi grande a influência do xamanismo nas religiões. As crenças de renascimento, manipulação de animais, os recolhimentos, abstenções, iniciações, batismos, ritos de morte e renascimento, canções sagradas, hinos, danças, transe, exorcismos, sacramentos, invocações, visões, preces, contato direto com divindades e espíritos, circuncisões, tatuagens, raspagens de cabeças, roupas ritualísticas, o conceito de três mundos (Céu, Inferno e Purgatório, por exemplo), uso de formas geométricas como amuletos e símbolos de proteção, subida nas montanhas para adquirir elevação espiritual, entre outros.
Religião vem de religare – “religar”, aquilo que religa à Deus. Nas sociedades menores, mais primitivas, da Mesopotâmia, África e Oceania, Ásia, Europa e nas Américas, dominavam as religiões chamadas panteístas, crendo que tudo é divino, que Deus e o Universo são unos, que Deus vive em tudo. Num estágio posterior surgem as religiões politeístas e o paganismo (têm forte ligação com a terra, natureza, tida como sagrada e viva). Em seguida, as monoteístas que admitem somente a existência de um único Deus e dominam mais da metade da população mundial. Já as seitas são, um segmento religioso menor, mas também é religião. Há uma forte influência xamânica na religião de Bön, na Ásia Central, e no Budismo Tibetano, Mongóis e Manchus, algumas dinastias chinesas que até utilizam substâncias enteógenas.
Práticas xamânicas foram sendo excluídas de muitas culturas, com a propagação do cristianismo, principalmente devido à crise das religiões greco-romanas, onde templos foram destruídos e as cerimônias excluídas, iniciando na idade média até o renascimento pela inquisição católica. Essa repressão estendeu-se com a colonização espanhola, através dos conquistadores que destruíam as tradições locais, e executavam os praticantes. Essas práticas universais sobreviveram clandestinamente à essa repressão, principalmente pelos povos indígenas, o que torna o xamanismo um fenômeno religioso.
As culturas africanas de tradição xamânica desenvolveram um sistema apoiado em deidades, espíritos animais, espíritos ancestrais, anjos, conhecida como Obeah, que se tornou a célula dos praticantes de Vodu. Também as primeiras cosmologias baseadas em visões xamânicas, que incluem conceitos de reinos superiores, inferiores.
As práticas xamânicas influenciaram tas religiões organizadas, vários aspectos são encontrados em suas práticas místicas e simbólicas. O paganismo grego, influenciado pelo xamanismo, é refletido na mitologia de Medeia, Prometeu, nos Mistérios Eleusianos e outros. Mais tarde essas práticas foram adotadas pela religião romana.
Na Rússia, as tradições xamânicas sobreviveram também, usando o cogumelo Amanita Muscária e outras plantas indígenas. Na Austrália, algumas plantas psicoativas (enteógenas) mais suaves foram usadas conjuntamente com a tradição extática de cantar, contar histórias no tempo do sonho. Nas Américas, uma fonte rica em psicoativos vegetais, criaram-se tradições xamânicas, principalmente através da ayahuasca ou iagé, utilizada por várias tribos na Amazônia, nos Andes o Wachuma (cacto San Pedro) e as folhas de coca. Na América do Norte, o peyote serviu à mesma finalidade sagrada. O tabaco foi usado também como planta cerimonial.
O estado do visionário envolve sempre algum grau de dissolução do ego. Quase toda a religião inclui este elemento em maior ou menor escala na reza de terços no catolicismo, na expansão do yoga, giro sufi, giras, recitação de mantras, etc. No Vodu há práticas que envolvem dançar até a exaustão e assim o corpo perde o controle, para conexão com o divino. Nas tradições tibetanas são usados também os harmônicos vocais, as posturas.
Dando prosseguimento às comparações entre as práticas xamânicas e as diversas filosofias/religiões, extraí um texto do livro de Ward Rutheford -“Shamanism, The Foundation of Magic”, onde ele coloca o tantrismo como uma das mais xamânicas religiões da Índia seguida pelo Budismo Tântrico e o Hinduísmo.
Quando o xamanismo é comparado com a religião egípcia, as similaridades são grandes: uso de instrumentos de poder, a condução ao mundo dos espíritos com segurança, o enterro com objetos, preparação do corpo dos mortos para o enterro, os paramentos dos sacerdotes para os trabalhos espirituais (trajes de poder, o uso de talismãs e braceletes com peles, dentes e ossos de animais, tambores, pinturas faciais e no corpo).
O tantrismo prevê a existência dos 7 chakras, ou 7 pontos de poder em nosso corpo sutil. Os chakras são vistos como microcosmos do Universo.
O iniciado tântrico submete-se à tutela de um mestre, que ensina os segredos esotéricos da doutrina. Também o sacerdote do budismo tântrico conta entre seus instrumentos de poder, com um tambor pequeno, seu instrumento ritual para evocar os ancestrais.
No rito sexual do tantrismo, o ato, ou maithuna, é considerado um modo de chegar à iluminação. Há também alguns vestígios da influência no taoismo, que também exalta o ato sexual como espiritualmente benéfico para mulheres e homens.
O taoismo, em efeito, é o sistema xamânico que mais integra a força feminina. Como se vê na filosofia yin yang, claramente o masculino e o feminino são opostos complementares.
Como a mulher pode ser Yin e necessita intercâmbios com Yang e o mesmo se aplica com o homem. Qualquer contato com a força contrária servirá até certo ponto, mas a maior manifestação se produz no ato sexual mesmo.
Tao significa “O Caminho” e é o caminho das forças naturais. O objetivo do taoísmo era sincronizar-se perfeitamente com a natureza e deixar que suas pulsações atinjam a mente e o corpo.
Para conseguir a sincronia com a mente e o corpo, recorriam à exercícios de yoga, ginásticas, aos elixires mágicos preparados por alquimistas, regras de dieta, atividade sexual variada; como elementos para melhorar a vitalidade e, finalmente, criar um corpo imortal tão refinado, que poderia abandonar o corpo mortal para compartilhar as bênçãos do Paraíso. Esse estado alterado de consciência é o que faz levantar voo do mundo material e vencer os limites do espaço/tempo. Esse ser imortal era denominado de pessoa alada ou gente alada.
O taoismo era tão incrustado na história da China, que fica difícil à quem atribuir o começo. O soberano Fu Hsi, 3.000 a.C. é representado por uma figura vestida com pele de leopardo, sentado numa pedra, contemplando uma tartaruga que o observa com veneração. Sobre o solo há os 8 hexagramas do I Ching, que foram inspirados pelos desenhos de um casco de tartaruga.
São óbvias as bases xamânicas de todas as religiões orientais. A estreita similaridade entre ela e sua tendência a formarem combinações, levaram através do séculos, um abafamento das diferenças.
As disciplinas tântricas são uma conseqüência de práticas xamânicas adiantadas, onde o ego é suprimido durante o momento do orgasmo. No fim oposto, práticas ascéticas podem ser usadas para conseguir o mesmo efeito que o sexo, privando o corpo dos confortos e mesmo de alimento ou água, para ascender à reinos mais elevados.
O Rabbi Gershon Winkler, descreve a relação que se estabelece através da tradição cabalística conhecida como Merkabah. As crenças incluem a reencarnação, e na crença que a alma devia atravessar seu ciclo de reencarnação nas “Sete Moradas Celestiais”, para ascender à mais alta de todas:
A Cabala segundo os místicos foi fundada pelo próprio Moisés. Veja como Moisés tinha traços xamânicos: utilizava um bastão para oração e fazer prodígios, mexia com forças da natureza, subia na montanha para falar com Deus, etc.
A árvore da Vida e a Montanha (Sinai, por exemplo) são metáforas comuns para descrever as jornadas xamânicas. Como a montanha dos xamãs, a Cabala une os Três Mundos, como se demonstra no sonho de Jacó. Os temas que dão origem na cabala aos “lugares sagradas feitos com pedras”, onde os profetas iam buscar a sua visão (Busca da Visão).
Podemos ver o Rabino como uma versão judaica equivalente ao xamã. Um curador, um homem de conhecimento, um guia espiritual. A Cabala é tão rica quanto a maioria das tradições xamânicas, compartilhando a terra, os elementos, a opinião que toda a criação é viva e consciente, que os planetas, as pedras, o sol e lua, são seres conscientes vivendo com sabedoria e alma.
No segundo-século Rabino Me’ir chamou o sol “meu irmão”, “todas as árvores,” ensinam os rabinos antigos, “e todos os seres vivos”. Os planetas e as estrelas têm suas próprias canções. Os Hebreus não tinham ainda o Torah, eles aprendiam tudo que necessitaram saber dos animais. Pergunte aos animais e ensiná-lo-ão; e os pássaros do céu, informá-lo-ão. Ou fale à terra e mostrá-lo-á; e os peixes do mar declarar-lhe-ão.
Este xamanismo judeu atribui importância enorme aos quatro sentidos, chamando-os ru’chot do ar’ba, ou “quatro ventos,” também hebreu para “quatro espíritos,” forçando a natureza orgânica, viva dos quatro sentidos.
Cada vento ou sentido são designados um animal; a águia no norte, no búfalo no oeste, o ser humano no sul, e o leão no leste. Einayim, Bamidbar, cada vento tem também guarda do espírito (que, quando invocado por vários invocações hebraicas e aramaico, traz a dádiva desse vento particular. Os atributos destes guardiões dos quatro espíritos são cura, reflexão, conforto, e visão.
Dizem muitas tradições que o ser humano nos primórdios, podiam se comunicar com animais e que havia um estado de confiança e amizade entre o homem e a fera. Algumas lendas judaicas afirmam que em todos os sentidos o mundo animal tinha uma relação com Adão diferente da relação que tinha com seus descendentes. Não somente conhecia a linguagem do homem, mas também respeitava a imagem de Deus, e tinha medo do primeiro casal humano, e tudo isso mudou para o seu contrário depois da queda do homem.
Na Cabala existem os Caminhos que vão para o Céu (Árvore da Vida). Cada caminho é simbolizado por um animal. O primeiro grupo de caminhos são chamados de Caminhos da Personalidade e os símbolos animais são: o crocodilo, o golfinho, o leão, o gavião, o pavão, o urso e o lobo. No Caminho da Individualidade ou do Eu Superior tem: o cavalo e o cachorro, o bode e o burro, o escorpião e o lobo. No Caminho do Adeptado: o elefante, rinoceronte, leão, a águia e o escorpião. Nos Caminhos do Espírito: o cachorro, castor, carneiro e coruja, o caranguejo e a tartaruga, o touro. Nos Caminhos da Divindade: o pardal, o pombo e o cisne, a andorinha e o macaco, a águia e o homem. São essas as vinte e duas estradas que correspondem aos arcanos maiores.